A mais de uma década, assisti a um documentário impressionante, pela "Nat Geo", que ultimamente pude rever, há em locadoras.
Trata-se de mulheres, e alguns homens chineses (diz-se que aqueles criados por travestis), que tiveram seus pés mutilados na infância.
O procedimento consistia em enfaixar permanentemente os pés das crianças com bandagens apertadíssimas, iniciando entre três e oito anos de idade. Quanto menor a idade da criança, mais "perfeita" a técnica.
A dor era terrível, e ficava-se sobre a cama quase o tempo todo, "privilégio" da classe média e alta, porém os pobres foram gradativamente aderindo à "vantagem", ao menos com a filha caçula.
Quando usamos um calçado um pouco apertado, sentimos o incômodo e dor, que dirá permanecer assim dia e noite!
O mal cheiro recendia, sendo necessário higienizar diariamente os pés e trocar as faixas, sob risco de sérias infecções.
Imagino o alívio do desenfaixamento, e ao mesmo tempo, a dor ao toque... as unhas de dedos retorcidos sob a sola dos pés, cresciam e cravavam a carne, enquanto os pés tentavam o mesmo.
Imagino o alívio do desenfaixamento, e ao mesmo tempo, a dor ao toque... as unhas de dedos retorcidos sob a sola dos pés, cresciam e cravavam a carne, enquanto os pés tentavam o mesmo.
Gangrenas por má circulação sanguínea eram comuns, e alguns dedos acabavam sendo perdidos, facilitando o trabalho do cuidador.
Após os treze anos, e para o resto da vida, as ataduras eram feitas pela própria "pés de boneca", pois a manutenção garantia o sucesso.
Sapatos especiais faziam parte do "tratamento de beleza", e eram artisticamente criados por artesãos e pelas próprias "´pés de lótus", como forma de lazer.
Muitas crianças ficavam tão debilitadas pela dor, impossibilidade de sono e dificuldade na alimentação, que qualquer probleminha de saúde as matava.
A "lótus dourada" era o comprimento de 7,5 cm para os pés, ideal quase inalcançável. Ultrapassando 10 cm, o trabalho era considerado malfeito.
Na juventude, era considerada a mais alta sensualidade, os pés de lótus suscitavam mais fetiche que a vulva, e um homem abastado apenas se casava com uma "pés de lótus", compensando o sacrifício familiar.
O marido envolvia seu pênis no vão dos dois pés aveludados (por não pisarem), como forma máxima de excitação sexual. Eram pétalas de lótus, e se a esposa os usasse para acariciar o esposo, então...
Na vida adulta, a pessoa era praticamente deficiente física, estando impossibilitada à maioria dos trabalhos e tornando-se um peso para a família. Cuidava da casa com apoio de diversos banquinhos.
Ainda hoje há velhinhas remanescentes desta barbárie abandonada (será?), que quando conseguem se locomover, necessitam de bengalas, tamanha a desproporcionalidade dos pés em relação ao corpo.
Há várias hipóteses para a comparação com a bela flor de lótus: o tamanho mínimo resultando em passos suaves, a curvatura do pé, que fica arqueado para baixo, imitando um salto alto, dentre outras.
A tradição durou cerca de 1.000 anos, e uma das justificativas era de que assim a pessoa "não criaria asas": não fugiria de casa ou não se aventuraria.
A prática se disseminou para outras partes da ásia, contudo em menor grau. Hoje é considerada arcaica, pois causa quedas e problemas ósseos na coluna e quadris, devido ao deslocamento irregular.
A última indústria de calçados para pés apequenados fechou em 1998, por falta de clientes.
Eis um poema, trazido ao ocidente por Howard Levy:
"Todas as noites, eu respiro seus pés, esse odor é teu e ninguém o possui... Eu só lamento não poder colocar na minha boca teu pé inteiro... como se fosse uma branca castanha... Mas eu posso lambê-lo todo... ah, isso eu posso."
Não postarei fotos, procure-as sob o título do post, são imagens incompreensíveis à nossa cultura, contudo anexadas à vaidade imposta por um padrão (destorcido) de beleza. E a origem da prática estava no maior prazer sexual masculino. Sempre!
Além do documentário, realizei inúmeras leituras para aos poucos, compor um esboço deste post, inviabilizando uma lista bibliográfica.
Além do documentário, realizei inúmeras leituras para aos poucos, compor um esboço deste post, inviabilizando uma lista bibliográfica.
Vale ressaltar, que em minha infância na roça, ser rechonchuda e ter pernas grossas fazia parte da ditadura da beleza, que só escravizava as filhas de fazendeiros, pois não precisavam trabalhar duro nas plantações.
Os pés acima da numeração 37 eram discriminados, pois as raquíticas moças caboclas não passam muito de um metro e meio de altura.
Ser magérrima, mutilada pela anorexia, como as modelos esquálidas de hoje, era sinal de pobreza e desnutrição no início da década de 70.
Atualmente, o uso de perigosos saltos altíssimos não nos faz refletir? E as desconfortáveis calcinhas "fio-dental", em corpos até de meninas pequenas...imposições do "parecer" se sobrepondo à simplicidade do "ser".